Após sofrerem fome e salários atrasados em até 11 meses, trabalhadores estrangeiros recebem socorro e deixam embarcação em São Sebastião

Professor da nossa Pós Graduação em Agronegócio e especialista em Direito Marítimo, Antônio Lawand foi responsável pela causa a favor dos trabalhadores do navio que sofreram fome e salários atrasados em até 11 meses.

Na audiência com a operadora do navio, uma empresa investidora apareceu com seus representantes legais, que celebraram um acordo.

Após sofrerem com fome e salários atrasados, 16 trabalhadores estrangeiros deixaram o navio mercante ‘Srakane’, de bandeira panamenha, em uma força-tarefa entre órgãos públicos em São Sebastião. Os homens socorridos são da Ucrânia, Croácia e Montenegro.

De acordo com o MPT (Ministério Público do Trabalho), a saga começou no dia 1º de junho, quando auditores-fiscais da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho receberam uma denúncia da ITF (Federação Internacional de Trabalhadores de Transportes) de pedido de socorro vindo da embarcação que havia recém-chegado no Litoral Norte.

As primeiras informações seriam a de que o navio não faria operação portuária, mas reparos mecânicos com o objetivo de fazer a troca temporária de bandeira e troca da tripulação, com embarque de trabalhadores brasileiros para a execução de serviços de cabotagem e transporte de mercadorias. No entanto, o atraso no pagamento de salários à tripulação impedia a atracação do navio e a troca de tripulantes.

Em contato com as autoridades, a empregadora justificou que a crise decorrente da pandemia de Covid-19 trouxe dificuldades financeiras à operação da embarcação. No dia 9 de junho, a inspeção do trabalho recebeu um pedido de socorro que informou que as provisões haviam acabado há cinco dias, e que a tripulação estava passando fome. O fato gerou desentendimentos, risco de motim e grande instabilidade emocional dentro do navio. No dia seguinte, a Marinha do Brasil levou provimentos ao navio e relatou completa escassez de água e comida.

Em paralelo, a Secretaria da Justiça e Cidadania foi acionada pelo Consulado Geral da Ucrânia em São Paulo, informando grave denúncia de violação de direitos humanos e trabalhistas envolvendo nacionais ucranianos, tripulantes do navio. A denúncia partiu de familiares dos trabalhadores na Ucrânia, em dificuldades financeiras devido à prolongada suspensão do pagamento dos salários.

Relatório de inspeção aponta que todos os tripulantes estavam com salários atrasados, alguns sem contrapartida remuneratória há quatro meses, e outros sem receber por 11 meses, havendo até aqueles que nunca receberam qualquer remuneração desde que começaram a trabalhar no navio.

“O tripulante não tem como deixar o seu local de trabalho. Quando é embarcado praticamente inicia a prestação de serviço automaticamente. O regime embarcado é marcado pelo confinamento, com jornadas estipuladas em turnos de revezamento. A falta de salário afeta diretamente seus dependentes e familiares que residem nos respectivos países de origem”, diz trecho do texto.

Além do Ministério Público do Trabalho e da Marinha, o caso foi acompanhado pela Secretaria da Justiça e Cidadania do Estado de São Paulo, Consulado da Ucrânia, Secretaria de Trabalho da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia e Polícia Federal.

Inicialmente, o débito salarial foi calculado em US$ 177.948,00 dólares, e até aquele momento, não havia contrato comercial com empresas brasileiras, conforme expectativas anteriores. O navio não zarpou porque a Inspeção Naval notificou uma série de inconformidades ao capitão. Foi constatado ainda que alguns tripulantes sequer tinham recebidos contratos anteriores prestados ao mesmo armador, sendo atualizado o débito salarial para US$ 230.055,00 dólares.

Em audiência com a operadora do navio, uma empresa investidora apareceu com seus representantes legais, que aceitaram celebrar um acordo, manifestando a necessidade de transportar a carga da embarcação para outro destino. A operadora e os investidores se comprometeram em TAC (Termo de ajuste de Conduta) a solucionar definitivamente a questão.

Colocando-se como fiadora, a empresa investidora declarou formalmente que pretende contratar a Oceans Wide para afretamento de carga própria e de terceiros, se comprometendo a pagar de forma adiantada, como sinal, o valor aproximado de US$ 300 mil dólares, que foram utilizados para quitar, na última sexta-feira (10), os débitos salariais contraídos com os trabalhadores estrangeiros, bem como custear passagens aéreas para sua repatriação; alojamento e alimentação dos marítimos que deixarem a embarcação, até o dia do seu embarque; remuneração e benefícios até a chegada ao local de repatriação; transporte de até 30 quilos de bagagem; e tratamento médico, se necessário.

O navio mercante “Srakane” teve sua posse transferida para a fiadora; a operação foi formalizada a partir do apostilamento do documento de transferência segundo a Convenção de Haia. O descumprimento das obrigações previstas no TAC gerará multa de R$ 50 mil para cada item infringido, cumulada com multa de R$ 10 mil por trabalhador.

No último sábado (18), quatro dos trabalhadores, três ucranianos e um montenegrino, desembarcaram e foram repatriados; os demais desembarcarão conforme progressiva substituição, de acordo com cronograma determinado pela legislação naval em relação a tripulação mínima de um navio mercante.

Fonte: O Vale

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