O uso da Lei Maria da Penha para a tutela de pessoas LGBTs se mostra relevante, tanto para relações conjugais, quanto para relações familiares. Quando pensamos na sua aplicabilidade, contudo, logo visualizamos como sujeitos da relação jurídica um homem-agressor versus uma mulher-vítima, levando em consideração somente uma visão cisheteronormativa das formas de se relacionar, o que resulta, sem dúvidas, na própria forma com que tutelamos e positivamos direitos.
O artigo 2º da Lei Maria da Penha é expresso ao definir que ela se destina a mulheres, independentemente de sua orientação sexual, de modo que sua incidência a lésbicas e mulheres bissexuais é indiscutível.
Inclusive, frisa-se que a lei prevê tão somente o gênero da vítima, mas, não o da parte agressora, não podendo, assim, se excluir a possibilidade dela ser preenchida por uma mulher. Nesse sentido, vale lembrar que a violência doméstica objeto da lei decorre do exercício da função patriarcal, que, por sua vez, pode ser desempenhada por identidades além da masculina*.
No que tange às travestis e mulheres trans, contudo, a incidência da Lei Maria da Penha ainda requer a interpretação dos aplicadores do Direito, vez que ausente previsão expressa nesse sentido. No entanto, tendo em vista que ela se dedica a sanar vulnerabilidade social associada ao gênero feminino, nada parece mais lógico do que também aplica-la às travestis e às mulheres trans.
O uso da Lei Maria da Penha em casos de casais de homens gays, por sua vez, é discutível, por parecer desvirtuar o objetivo de tutela da mulher da legislação. Mesmo assim, há decisões favoráveis, fundamentadas não no gênero que a lei visa proteger, mas sim, na própria violência doméstica.
Diante disso, concluímos que, apesar de ser possível a aplicação da Lei Maria da Penha às pessoas LGBTs, não se trata de um trabalho trivial. A pluralidade das relações pessoais exige dos operadores do Direito o estudo aprofundado do tema, possibilitando, assim, a melhor forma de aplicar a lei nesses diversos contextos.
*Para saber mais, SAFFIOTI, Heleieth Iara Bongiovani. Contribuições feministas para o estudo da violência de gênero. Cadernos Pagu (UNICAMP).
Créditos a Professora da nossa Pós em Direito LGBT, @sulzbachmarina