No último dia 26/03, os investidores interessados em adquirir ativos distressed receberam uma boa notícia que deverá ajudar a fomentar os negócios. O Congresso Federal derrubou 12 dos 14 vetos presidenciais à Lei nº 14.112/2020, que altera a LRF (Lei de Recuperação de Empresas e Falência – Lei nº 11.101/2005), dentre eles o veto ao dispositivo que versa sobre aquisição de Unidades Produtivas Isoladas (UPIs), trazendo mais segurança jurídica e econômica, principalmente no contexto de operações de fusão e aquisição.
Pela redação atual, o objeto da alienação de UPI estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor de qualquer natureza, incluídas, mas não exclusivamente, as de natureza ambiental, regulatória, administrativa, penal, anticorrupção, além de tributária e trabalhista, as duas últimas já previstas na redação original da lei.
A alteração confere maior segurança jurídica à venda de UPIs no ambiente da recuperação judicial, esclarecendo que a ausência de sucessão se estende às demais matérias não previstas na redação anterior da LRF.
A modificação exime os novos donos de qualquer sucessão por obrigações ambientais, regulatórias, administrativas, penais, tributárias, trabalhistas e anticorrupção. Vale salientar que a nova regra se aplica apenas para vendas realizadas após a entrada em vigor da Lei, que ocorreu no dia 26/03/2021.
A sucessão por obrigações anticorrupção, em particular, é um tema de interesse dos investidores desde a entrada em vigor da Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013), em 2014. Isto porque o artigo 4º, parágrafos primeiro e segundo desta lei determina a sucessão nas multas e danos em caso de fusão e incorporação (no limite do patrimônio transferido) e a solidariedade nas multas e danos para empresas controladoras, controladas, coligadas ou consorciadas (no âmbito do respectivo contrato). Não há na lei referência específica à sucessão nos casos de aquisição de ativos.
O novo texto protege os adquirentes das UPIs de obrigações decorrentes de eventuais atos ilícitos praticados pelos antigos donos, em benefício ou interesse dos ativos adquiridos ou por atos ilícitos praticados pelos próprios ativos, incluindo valores de multas aplicadas em Processos Administrativos de Responsabilidade, acordos de leniência e até aos danos causados ao patrimônio público. O próprio parecer de justificativa do Senado por ocasião da votação do então projeto de lei destaca que a mudança amplia a blindagem aos adquirentes de ativos nos processos de recuperação judicial e falências, que “deixam de assumir dívida alguma, mesmo se as normas anticorrupção assim exigirem”.
Contudo, as mudanças na Lei nº 11.101/2005 não são um salvo-conduto para atos de corrupção, de forma que as próprias empresas que eventualmente tenham praticado atos de corrupção continuam podendo ser responsabilizadas pelos seus atos ilícitos, mesmo se passarem por processo de recuperação judicial ou falência. De acordo com a Lei Anticorrupção, esta responsabilidade persiste nos casos de alteração contratual, transformação, incorporação, fusão ou cisão societária – na maioria destes casos, não há que se falar em sucessão, por se tratar das mesmas pessoas jurídicas ou de suas continuidades. A proteção trazida pela Lei nº 11.101/2005 recai apenas sobre o adquirente, incentivando a aquisição de ativos estressados nos processos de recuperação.
Na prática, as mudanças na Lei de Recuperação de Empresas e Falência trazem segurança jurídica e claridade ao estabelecer a responsabilidade de antigos donos em atos impróprios que tenham praticado em benefício do seu grupo econômico. Esta inovação beneficia tanto as empresas que passam por processos de recuperação ou falência e que precisam com urgência de liquidez e caixa, muitas vezes em decorrência até mesmo de envolvimento em atos de corrupção, quanto fundos e empresas investidoras, que passam a ter mais segurança jurídica ao adquirir ativos eventualmente envolvidos em problemas de corrupção.
FONTE: Estadão