O poder público não pode ter carta branca para definir quem está em “estado de drogadição” nas ruas da capital paulista. Assim entendeu o desembargador Reinaldo Miluzzi, do Tribunal de Justiça de São Paulo, ao derrubar decisão de primeira instância que permitia a internação compulsória de pessoas consideradas viciadas em crack.

Ele atendeu pedido do Ministério Público estadual e da Defensoria Pública, em plantão judicial, por considerar que o dano potencial é urgente.

No dia 25 de maio, o juízo de primeiro grau avaliou que agentes de saúde e guardas civis metropolitanos poderiam abordar possíveis usuários de drogas na região da cracolândia e nas imediações para avaliar o estado dessas pessoas. Caso considerassem necessária a internação compulsória, a gestão do prefeito João Doria (PSDB) faria um pedido à Justiça, que analisaria caso a caso.

Miluzzi, no entanto, avaliou que esse tipo de medida “contrasta com os princípios basilares do Estado Democrático de Direito” ao permitir que o município eleja viciados para recolher à força.

A decisão de primeira instância foi tomada pelo juiz Emílio Migliano Neto, que também havia determinado decretado sigilo do processo. O desembargador também derrubou o segredo judicial.

Argumentos da prefeitura
Para a Prefeitura de São Paulo, a medida é necessária porque os usuários de drogas que andam pela região da cracolândia, no centro, não têm mais controle sobre seus atos e precisam de auxílio. A administração alegou ainda que as condições sanitárias da área são péssimas, afetando inclusive a coletividade.

“Os interesses individuais dessas pessoas, que não conseguem mais se conduzir pelas próprias razões, encontrando-se em estado tal de drogadição que precisarão de tratamento extremo (internação compulsória)”, diz a prefeitura.

Em entrevista à ConJur publicada neste domingo (28/6), o secretário de Justiça da cidade de São Paulo, Anderson Pomini, afirma que a internação compulsória não é uma pena e sim um tratamento para desintoxicação em casos extremos.

“A internação compulsória, devido à sua gravidade, somente pode ser realizada caso a caso, não há outra hipótese, e em último caso, após verificadas clinicamente as demais alternativas terapêuticas. Nossa petição formulada à Justiça pretende autorização judicial para busca e apreensão daquelas pessoas (…) inimputáveis. Para que possam ser analisadas por uma junta médica e multidisciplinar, que poderá decidir ou não pela internação compulsória como última solução ao gravíssimo problema enfrentado”, declara o secretário.

Críticas à ideia
A Defensoria Pública de São Paulo e o MP-SP se manifestaram contra o pedido da prefeitura paulistana. Para os defensores públicos, o pedido é extremamente vago, amplo e perigoso, sem dar possibilidade de defesa às pessoas abordadas.

A Defensoria argumenta que a Lei Antimanicomial (Lei Federal 10.216/2001) limita a internação compulsória quando outras tentativas de tratamento forem insuficientes. Diz ainda que essa medida deve ser excepcional, com laudo médico prévio, e que o pedido afronta as leis federais Lei 8.080/90 e Lei 11.343/06.

A primeira, que rege os princípios do Sistema Único de Saúde (SUS), determina a preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade física e moral. Já a segunda, que é a Lei de Drogas, garante o respeito aos direitos fundamentais da pessoa humana, especialmente à sua autonomia e liberdade, com respeito aos usuários e dependentes de drogas.

Barracos no chão
A cracolândia foi palco de confronto no último domingo (21/5) com a entrada dos policiais na região, que alegaram a necessidade de prender traficantes. Depois das prisões, agentes derrubaram barracos dos moradores de rua que lá estavam e os retiraram da área para que fosse feita a limpeza.

Também foi demolida parte de um prédio sem a confirmação de que pessoas ainda estavam no imóvel. Três ficaram feridos.

Em outra liminar, proferida nesta quarta-feira (24/5) pela 3ª Vara da Fazenda Pública, a prefeitura foi promovida de promover novas emoções na área da cracolândia sem prévio cadastramento das pessoas para atendimento de saúde e habitação. A decisão reconhece ainda que moradores podem retirar pertences e animais de estimação dos imóveis.

Fonte: ConJur

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