A proposta (PLC 34/2015) reacendeu a polêmica sobre os alimentos transgênicos — mais especificamente, sobre o direito dos consumidores de saber se os produtos ofertados nas prateleiras dos supermercados contêm ou não organismos geneticamente modificados.

Atualmente, se há milho ou soja transgênica na composição do alimento à venda, por exemplo, a informação deve estar no rótulo. Se o projeto virar lei, só haverá aviso se for detectado a partir de 1% de material transgênico no produto acabado.

A proposta também retira das embalagens a letra T gravada em negro dentro de um triângulo de fundo amarelo. Utilizado há 14 anos no Brasil, o símbolo objetiva ajudar o consumidor a reconhecer os alimentos com matéria-prima transgênica. O projeto em estudo na CRA mantém apenas a informação escrita — “contém (nome do ingrediente) transgênico”.

O projeto foi elaborado pelo deputado Luis Carlos Heinze (PP-RS). Para o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que foi o relator da proposta na Comissão de Ciência e Tecnologia (CCT), o ponto nuclear é a exigência de comprovação da presença de transgênicos no produto final. A CCT votou com Randolfe e rejeitou o projeto, com base no argumento da impossibilidade técnica de obter material genético íntegro no produto acabado, para efeito de identificação da transgenia.

— O projeto não interessa ao consumidor, mas apenas àquelas empresas que querem ludibriar as pessoas, obrigá-las a adquirir produto objeto de transgenia sem que elas tenham conhecimento disso — criticou Randolfe.

Ideologia

Na CRA, o relator é Cidinho Santos (PR-MT), que pede a aprovação. Segundo o senador, incompreensões sobre a importância da tecnologia genética no campo dos alimentos levam os críticos a reagirem ao projeto por “motivos ideológicos ou religiosos”.

Para Cidinho, a fiscalização por amostras do produto final é a forma mais racional de comprovar se está sendo obedecida a legislação que torna obrigatória a oferta de informações ao público. Cidinho também discorda do uso do símbolo T nos rótulos, na sua visão “um elemento que motiva preconceitos contra alimentos seguros”.

— Não é necessário meter no produto um T grandão. Isso pode criar algo no inconsciente das pessoas e desvalorizar a mercadoria perante o mundo — argumenta.

Os passos da proposta no Congresso são acompanhados tanto por ONGs ambientalistas e associações de consumidores, contrárias à aprovação, como por entidades que representam a indústria de alimentos, que apoiam as mudanças sugeridas.

Os críticos concordam com Randolfe. Para eles, as novas regras propostas por Heinze buscam ocultar a origem transgênica dos alimentos. Eles argumentam que aprovar a proposta equivalerá a fraudar direitos do cidadão. O advogado Maurício Guetta, do Instituto Socioambiental (ISA), afirma:

— Não existe no país proibição ao consumo de transgênicos. O que precisa haver é informação adequada, para que o consumidor possa tomar a decisão de usá-los ou não. Se o projeto for aprovado, certamente a lei que se originar dele será objeto de questionamento no Supremo Tribunal Federal.

A questão central do projeto não é a retirada do símbolo T dos rótulos, de acordo com os críticos. Ainda mais prejudicial seria a mudança relativa ao momento da detecção da presença de transgênicos — não mais com base na matéria-prima, mas no produto acabado.

Ocorre que boa parte dos alimentos que contêm organismo geneticamente modificado é ultraprocessada, caso do óleo e da margarina. Devido aos processos químicos envolvidos, o material genético do alimento in natura acaba alterado ou danificado. É o que explica Luiz Beltrão, biólogo e consultor legislativo do Senado da área de meio ambiente:

— Mesmo que o produto tenha sido feito com 100% de matéria-prima transgênica, a consequência é que se perderá a rastreabilidade dessa informação — afirma.

Estigmatização

Plantações_geneticamente_modificadas_no_Brasil.jpegAtualmente, vigoram regras que buscam assegurar a rastreabilidade dos alimentos transgênicos em toda a cadeia produtiva e logística do alimento, desde as sementes até a oferta dos produtos no comércio.

Ainda no campo, a informação sobre a natureza do produto deve constar dos documentos de venda dos produtos. De modo sucessivo, em cada etapa do processo até a elaboração do produto final, a informação está disponível, sem a necessária obrigação de testes laboratoriais.

Já os defensores do projeto reforçam os argumentos de Cidinho. A Associação Brasileira das Indústrias de Alimentos (Abia) não reconhece os defeitos que estão sendo apontados no projeto.

Primeiro, a entidade observa que o texto não acaba com a obrigatoriedade de informar nos rótulos a presença de organismos geneticamente modificados no produto final. Segundo, para a Abia, o triângulo amarelo com o T no centro estigmatiza os transgênicos, pois pode levar o consumidor a considerar que os alimentos com essa característica são nocivos à saúde. Segundo a entidade, o símbolo se assemelha a placas de advertência e atenção afixadas em locais de perigo, radiação, eletricidade e explosão.

A Abia afirma que as culturas transgênicas passam por rigorosas avaliações científicas e só podem ser liberadas para consumo após aprovação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio).

Receios

O consultor Luiz Beltrão está entre os que enxergam função didática e informativa no uso do T nos rótulos, por ser de rápida identificação, o que não acontece com a informação escrita “contém transgênico”. Para Beltrão, é equivocado associar o símbolo a reações de medo ou preconceito.

— Não há pesquisas que indiquem que o símbolo assusta, induza receios ou erros. Ao contrário, muitas pessoas ignoram a simbologia do T amarelo.

Guetta, do ISA, adverte para o risco de toda a discussão do projeto se concentrar na retirada ou não do T, com perda do foco sobre o que ele acredita que realmente está em jogo: a imposição da detecção da transgenia por meio da análise de laboratório somente no produto final.

Fonte: Senado Federal

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