O Tribunal Superior do Trabalho (TST) tem entendido que mesmo trabalhadores com direito à justiça gratuita devem pagar honorários sobre valores de pedidos negados pelos juízes – a chamada sucumbência. Sete das oito turmas já analisaram a questão e adotaram esse posicionamento.

Os trabalhadores, em geral, são condenados pelo TST a pagar 5% da verba não concedida. Esses valores devem ser descontados do que receberiam das empresas ou até mesmo de créditos obtidos em outros processos. A questão é discutida em cerca de 1,07 milhão de ações, segundo levantamento da DataLawyer.
Antes da reforma trabalhista (Lei nº 13.467, de 2017), o trabalhador não pagava honorários de sucumbência ao advogado da empresa. Agora, está sujeito a ter que desembolsar de 5% a 15% sobre as verbas não concedidas pela Justiça, segundo o artigo 791-A da norma.

No parágrafo 4º do mesmo artigo, a lei ainda estabelece que caso o trabalhador com acesso à Justiça gratuita obtenha em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, este deve arcar com o pagamento dos honorários sucumbenciais.
Os defensores da medida entendem que é essencial para evitar o que chamam de “processos aventureiros”. Até então, os trabalhadores entravam com vários pedidos por não terem nada a perder. Para os representantes de trabalhadores, porém, a cobrança inibe o acesso à Justiça, principalmente dos mais pobres.
Para o advogado de empresas Alberto Nemer, do escritório Da Luz, Rizk & Nemer, que coordenou a pesquisa sobre a jurisprudência, os honorários de sucumbência “vieram trazer responsabilidade para o trabalhador e mostrar que a Justiça do Trabalho não é palco para aventuras judiciais”. “Se o empregado realmente pedir o que é devido, nada vai pagar”,
acrescenta.

Já na opinião da advogada e professora da PUC-SP, Fabíola Marques, sócia do Abud Marques Sociedade de Advogadas, essa previsão da reforma que tem sido aplicada no TST traz um enorme prejuízo ao trabalhador. “Não faz sentido descontar esses valores do que o trabalhador tem para receber, que são verbas salariais, de natureza alimentar, algo que é necessário para a
sobrevivência dele”, diz.

Após a entrada em vigor desse dispositivo, segundo Fabíola, se o trabalhador percebe que terá dificuldade de provar o pedido, mesmo que entenda que seu direito foi violado, resolve não correr o risco.
Apesar da previsão em lei, alguns tribunais regionais preferem não aplicar a reforma e tem declarado esse ponto inconstitucional. É o caso, por exemplo, do TRT do Espírito Santo. A 5ª Turma, ao analisar o caso, reformou a decisão. O relator, ministro Breno de Medeiros, entendeu que o regional ao decidir que os honorários fixados em favor da empresa não podem atingir os créditos do beneficiário da justiça gratuita, ainda que em outro processo, suspendendo então a sua exigibilidade, está em desacordo com o que prevê a reforma trabalhista (processo nº 716-86.2018.5.17.0005). A decisão foi publicada no dia 30 de abril.

Segundo Alberto Nemer, que assessora a empresa de transporte no processo, o motorista que entrou com ação pedia cerca de R$ 150 mil contra a empresa. Pela decisão, ele teria direito a receber cerca de R$ 5 mil, mas foi condenado a pagar R$ 7,5 mil de honorários. “O empregado não vai poder levantar nenhum valor e ainda tem uma dívida com a empresa, que pode localizar o restante em outros processos”, diz.
Em outro caso, a 3ª Turma do TST, por unanimidade, condenou ex-trabalhador de um frigorífico a pagar 5% de honorários. O relator, ministro Alberto Bresciani, destaca na decisão que, ainda que a lei tenha previsto expressamente ao litigante hipossuficiente a obrigação de pagar a verba
honorária, considerou apenas duas hipóteses de incidência: o recebimento de valores em juízo, ou a comprovação da alteração das condições econômicas, no prazo de dois anos.

De acordo com Bresciani, “nessa perspectiva, tenho comigo que a obrigação criada pela nova lei respeita as peculiaridades do beneficiário da justiça gratuita, pois institui regra própria, a qual, ainda que diversa da anterior, impõe limite à cobrança da verba honorária, segundo as possibilidades da parte para a quitação”.

Para o ministro, “não há que se falar em lesão ou desrespeito aos princípios da dignidade ou da isonomia, na medida em que as partes foram tratadas pelo legislador segundo a medida de suas desigualdades” (processo nº 1195-45.2017.5.23.0006). A última palavra sobre o tema, contudo, ainda será dada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Em maio de 2018, os ministros começaram a analisar a questão, por meio de ação direta de
inconstitucionalidade (ADI 5766) ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR).

Por enquanto, foram proferidos apenas dois votos, em sentidos diferentes. O relator, ministro Luís Roberto Barroso, votou a favor da manutenção da previsão da reforma trabalhista, mas com limites.

Ele entendeu que a cobrança de honorários sucumbenciais do hipossuficiente poderá incidir sobre verbas não alimentares, a exemplo de indenizações por danos morais, e sobre o percentual de até 30% do valor que exceder ao teto do Regime Geral de Previdência Social, mesmo quando
pertinente a verbas remuneratórias. Segundo a votar, o ministro Edson Fachin considerou a questão inconstitucional.

Para a advogada Mayra Palópoli, do escritório Palópoli & Albrecht Advogados, essa limitação em 30% dos valores recebidos pode ser um meio termo, uma vez que tanto as verbas obtidas pelos trabalhadores quanto os honorários são considerados créditos alimentares.

FONTE: Valor Econômico

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