O 1º Juízo da Vara Cível do Foro Regional do Partenon da Comarca de Porto Alegre/RS condenou a empresa UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA a reestabelecer a conta de um motorista em sua plataforma tecnológica e a indenizar-lhe pelos dias parados e pelo dano moral sofrido após tê-lo bloqueado sem justo motivo.
Empresas como Uber e 99 POP disponibilizam uma plataforma tecnológica, comumente chamada de aplicativo, onde os motoristas se cadastram, criam uma conta e, se aprovados, passam a angariar clientes (passageiros) e a efetuar viagens remuneradas.
Ocorre que tem se tornado cada vez mais frequente essas empresas desligarem os motoristas do aplicativo de forma unilateral e sem justo motivo.
A conduta é sempre a mesma, o motorista vem trabalhando regularmente no aplicativo e, de forma inesperada e sem aviso prévio, a sua conta é bloqueada. No caso da UBER, aparece a temida frase: “A conta requer atenção”.
A partir daí começa o pesadelo do motorista que para entender o que ocorreu tenta contato com a empresa pelo próprio aplicativo, obtendo a resposta genérica que o motivo do bloqueio decorre da violação dos termos de conduta da empresa, sem dizer, contudo, qual a violação e quais termos.
Buscando esclarecer o motivo e retornar ao trabalho o motorista liga para a empresa e/ou vai até um escritório, mas a empresa continua sem esclarecer os fatos e a prestar informações genéricas. Os atendentes alegam que não têm acesso às informações que levaram ao bloqueio do motorista e muitos admitem que se esse quiser realmente saber o motivo, deve ingressar com ação judicial.
E foi exatamente isso que o motorista Carlos fez. Buscou assessoria jurídica especializada em ações contra empresas de aplicativo. Explicou que era um motorista exemplar e que jamais havia descumprido qualquer termo de conduta que pudesse lhe levar à exclusão da plataforma.
Carlos é casado, tem dois filhos e trabalha com o aplicativo UBER desde 2018, tendo a plataforma como sua única fonte renda. Possuía status de motorista diamante, nota 4,92 estrelas de 5 possíveis, alta taxa de satisfação e mais de 10 mil viagens.
Ajuizou ação para que a UBER lhe informasse o motivo do bloqueio de sua conta e lhe readmitisse na plataforma, requerendo também indenização pelos dias parados e pelo dano moral sofrido.
Contestando, a UBER alegou que o verdadeiro motivo que levou ao encerramento da conta de Carlos foi a constatação da existência de um apontamento criminal no sistema do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná.
Ocorre que a alegação era inverídica, pois o motorista trouxe ao processo as certidões negativas criminais daquele estado, demonstrando que não possuía antecedentes registrados.
O advogado Cristiano Luconi, representante do motorista na causa, esclarece que: “Diante da autonomia da vontade as empresas de aplicativo têm o direito de escolher quais os motoristas podem trabalhar utilizando a sua plataforma, bem como podem excluir sumariamente aqueles que infringirem os seus termos de uso. Contudo, isso não lhes dá o direito de excluir motoristas sem justo motivo, devendo esclarecer a sua conduta sob pena de incorrer em abuso de direito e no consequente dever de indenizar”.
Para a magistrada que julgou o caso, restou comprovado que o procedimento da UBER em cancelar a conta do motorista sob a justificativa de que esse infringiu os termos de uso do aplicativo se mostrou equivocado, haja vista que não possui antecedentes criminais, o que tornou o ato ilícito.
E seguiu esclarecendo que a UBER tem o poder e o dever de reavaliar os serviços prestados a fim de preservar a segurança dos usuários, porém, esse poder-dever deve ser exercitado em consonância com os “ditame legais” e “com base em informações dotadas de veracidade”.
A decisão de primeira instância foi confirmada por unanimidade pelos desembargadores da 12ª Câmara Cível do TJRS que reconheceram a abusividade da resilição contratual, determinando que a UBER mantenha a conta do motorista ativada junto ao aplicativo de transporte de passageiros por no mínimo mais 120 (cento e vinte) dias, bem como mantiveram a condenação para o ressarcimento dos dias parados e pelo dano moral experimentado.
A confirmação da sentença em segunda instância renova as esperanças de todos os motoristas que mesmo trabalhando corretamente acabam tendo a sua conta bloqueada e são excluídos de forma desleal das plataformas tecnológicas.
Por fim, o advogado Cristiano Luconi afirma que “o desfecho desse caso deveria ser a regra no judiciário brasileiro, pois se sabe que além desses motoristas terem um trabalho excessivo e exaustivo, haja vista dirigirem de 10hs a 12hs por dia sem qualquer direto trabalhista ou previdenciário, ainda têm que arcar com todos os riscos da atividade econômica das empresas de transporte, astutamente autodenominadas empresas de tecnologia, que lhes impõe metas para ter benefícios no aplicativo. A atividade se dá com intuito do sustento as suas famílias de forma digna e honesta, não pendendo, assim, estarem sujeitos a abusos de direito por parte das empresas que, em verdadeira afronta à boa-fé e à função social do contrato, os bloqueiam e excluem suas contas da plataforma sem qualquer explicação ou justo motivo, ferindo de morte princípios constitucionais como o do livre exercício de qualquer trabalho lícito e, principalmente, o da dignidade da pessoa humana”.
FONTE: Direito News