O princípio da insignificância é inaplicável aos crimes contra a Administração Pública. Com esse entendimento, a 2ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo negou o trancamento de uma ação penal em que a substituta do Oficial Titular do 1º Registro de Imóveis de Sorocaba foi acusada de peculato.

De acordo com os autos, a ré teria desviado de suas destinações típicas, em proveito próprio, o valor de R$ 54,99 devido para emissão de uma certidão. Em defesa preliminar, os advogados pediram a aplicação do princípio da insignificância, o que não foi acolhido pelo juízo de origem.

“O ponto principal da atipicidade da conduta em relação ao peculato é que nunca houve a posse prévia, direta ou indireta, da coisa, em razão da função que exercia a paciente, seja de bem público, seja de bem particular sob a tutela da administração pública”, alegou a defesa.

Segundo os advogados, a ré teria uma dívida com um motoboy da cidade. Ao expedir uma certidão no cartório, ele teria pedido para que a acusada efetuasse o pagamento e, com isso, o valor de R$ 54,99 seria abatido da dívida. Mas a oficial teria se esquecido de repassar o dinheiro ao cartório, o que ocorreu antes do recebimento da denúncia.

Assim, conforme a defesa, como não houve a posse do valor, a acusada não deveria ser processada por peculato. O relator, desembargador Alex Zilenovski, discordou da tese e afirmou que a “posse”, a depender do caso, não é imprescindível para a configuração do delito de peculato.

“Em tese, consoante descrito na denúncia, houve desvio do valor referente à certidão, expedida a pedido do motoboy, em proveito próprio da paciente, ou seja, para abatimento de dívida pretérita existente com o solicitante”, pontuou o magistrado.

Diante da imputação de fatos específicos que podem configurar infrações penais, o relator afirmou que a ação penal deve prosseguir regularmente, tal como determina a lei. “Irrelevante tenha a paciente recolhido o valor devido antes do recebimento da denúncia, já que tal providência não é capaz de afastar a responsabilidade penal”, completou.

Zilenovski lembrou que o trancamento de ação penal por meio de Habeas Corpus, apesar de possível, é medida excepcional, somente admitida nas hipóteses em que se mostrar evidente, de plano, a ausência de justa causa, a inexistência de elementos indiciários demonstrativos da autoria e da materialidade do delito, o que não aconteceu no caso concreto.

“No caso dos autos, para se estabelecer a ocorrência ou não da responsabilização penal da paciente necessário se faria uma análise aprofundada da prova, o que, por certo, não pode ser feita nesta via eleita, devendo, portanto, tais alegações serem analisadas no julgamento do mérito da ação penal”, disse.

Por fim, o relator também afastou a aplicação do princípio da insignificância, citando precedentes dos tribunais superiores. “Em que pese não se tratar de desvio de elevado valor, trata-se de crime contra a administração pública, o que denota maior grau de reprovabilidade da conduta”, explicou. A decisão foi unânime.

2113232-87.2022.8.26.0000

Fonte: Conjur

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