Patrícia Castro Dutra

O presente artigo visa a uma análise breve sobre as alterações trazidas pela Lei nº 14.181/21 ao Código de Defesa do Consumidor.

A chamada Lei do Superendividamento – Lei nº 14.181/21 – foi publicada em 01º de julho de 2021, trazendo alterações significativas ao Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90) e ao Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/03).

O artigo 54-A, da Lei nº 14.181/21 define o superendividamento como a “impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação.”.

Aqui se incluem todas e quaisquer dívidas, oriundas de relações de consumo e de crédito, compras a prazo e de prestação continuada, independentemente da sua natureza. Contudo, o §3º do artigo 54-A traz uma importante restrição, pois essa proteção não se aplica ao consumidor que tenha agido de má- fé ou em fraude aos seus credores.

Garantir o mínimo existencial significa permitir que o consumidor endividado tenha margem financeira para pagar todos os seus credores e sobrar valores suficientes à sua manutenção mensal. Essa garantia evita a contratação de novas dívidas para que o consumidor já endividado pague contas básicas, como água e luz.

Uma importante alteração trazida pela Lei do Superendividamento foi agregar dois novos Princípios ao rol do artigo 4º, do Código de Defesa do Consumidor, quais sejam, Educação financeira e ambiental e Prevenção e tratamento do superendividamento. Isso porque a ideia da lei é justamente trazer mais conhecimento à população e, dessa forma, prevenir o superendividamento ou, se já instaurado, resolver da forma mais amena ao consumidor.

Além disso, a Lei nº 14.181/21 reconheceu três novos direitos básicos do consumidor:

  • a garantia de práticas de crédito responsável, de educação financeira e de prevenção e tratamento de situações de superendividamento, preservado o mínimo existencial por meio da revisão e da repactuação da dívida;
  • a preservação do mínimo existencial na repactuação de dívidas e na concessão de crédito;
  • a informação acerca dos preços dos produtos por unidade de medida, tal como por quilo, por litro, por metro ou outra unidade, conforme o caso.
  • E incluiu, no rol das cláusulas consideradas abusivas, as condutas que condicionem ou limitem de qualquer forma o acesso aos órgãos do Poder Judiciário; e que estabeleçam prazos de carência em caso de impontualidade das prestações mensais ou impeçam o restabelecimento integral dos direitos do consumidor e de seus meios de pagamento a partir da purgação da mora ou do acordo com os credores. Se ocorrerem, essas cláusulas serão consideradas nulas de pleno direito, em favor do consumidor hipossuficiente.

Ainda, a Lei nº 14.181/21 tornou muito mais transparentes as negociações financeiras, obrigando bancos, financiadoras e empresas que vendem a prazo a informar ao consumidor o custo efetivo total, a taxa mensal efetiva de juros e os encargos por atraso, o total de prestações e o direito de antecipar o pagamento da dívida ou parcelamento sem novos encargos. E as ofertas de empréstimo ou de venda a prazo deverão informar a soma total a pagar, com e sem financiamento. Essas inovações trazem mais transparência às negociações, impedindo o consumidor de obter um crédito ou realizar uma compra da qual não saiba na íntegra o valor final, tendo como finalidade a preservação do seu mínimo existencial e da sua dignidade.

A Lei do Superendividamento também proibiu expressamente a realização de propagandas de empréstimos do tipo “sem consulta ao SPC” ou sem avaliação da situação financeira do consumidor; bem como proibiu o assédio ou a pressão sobre o consumidor para contratar o fornecimento de produto, serviço ou crédito, principalmente em caso de idosos, analfabetos, doentes ou em estado de vulnerabilidade. Deve-se levar em conta sempre o estado de hipossuficiência do consumidor, que deve ser protegido contra as práticas abusivas do mercado.

A Lei também trouxe a possibilidade de o consumidor questionar valores que não reconhece em sua fatura de cartão de crédito, devendo avisar à administradora do cartão crédito com dez dias de antecedência do vencimento da fatura. Assim agindo dentro do prazo, o valor questionado não poderá ser cobrado enquanto não houver uma solução para a questão.
Duas alterações muito significativas introduzidas pela Lei nº 14.181/21 são a criação de um capítulo inteiro para tratar da prevenção do superendividamento da pessoa natural, o crédito responsável e a educação financeira do consumidor, e outro capítulo para aqueles já superendividados poderem conciliar suas dívidas com os credores.

Dentre essas novidades trazidas pela Lei nº14.181/21, há a possibilidade de o consumidor superendividado negociar todas as suas dívidas ao mesmo tempo, com todos seus credores, perante o Poder Judiciário. Essa negociação ocorre através da distribuição de um processo judicial de revisão dos contratos, no qual o consumidor superendividado apresenta um plano de recuperação do seu crédito, que poderá chegar ao prazo de até cinco anos. É como se fosse um plano de recuperação judicial em caso de falência, mas aplicado à pessoa física superendividada e de boa-fé.

No processo revisional de contratos, caso não haja realização de acordo entre o consumidor superendividado e seus credores, o juiz estabelecerá um plano de recuperação judicial obrigatório entre todos, fixando valores, prazos e forma de pagamento, e sempre levando em conta a proteção do mínimo existencial do consumidor, de forma que o mesmo tenha condições de pagar as dívidas mensalmente e manter a sua dignidade.

Essas alterações legais são muito importantes porque conferem maior proteção à pessoa física na obtenção de crédito e na prevenção e resolução de superendividamento. Traz ao consumidor garantias de transparência nas negociações, de cálculo de limite de renda para a obtenção de crédito e de informação sobre todos os aspectos da negociação, além da educação financeira. E, se mesmo assim, o consumidor estiver superendividado, não conseguindo quitar suas obrigações sem comprometer o mínimo existencial, a lei também garante ao mesmo a melhor forma de conciliação e quitação de todas as suas dívidas.

Patrícia Castro Dutra é aluna das: Pós-Graduação em Direito Público com ênfase em Direito Constitucional pela Verbo Jurídico e da Pós-Graduação em Prática Sistêmica do Direito e das Constelações Familiares no Sistema de Justiça, pela Verbo Jurídico.

Bibliografia:

  • Lei 14.181/21
  • A Lei do Superendividamento e o processo de repactuação de dívidas (contabeis.com.br)
  • Sancionada lei que visa prevenir superendividamento de consumidores – Migalhas
  • De dívidas a consignado: Consumidor e a nova lei de superendividamento – Migalhas
  • Lei que protege está valendo; entenda as mudanças (istoedinheiro.com.br)
  • O que muda para os consumidores com a lei que protege os superendividados | Idec – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor
  • O que muda com a lei do superendividamento? – YouTube
  • Lei do superendividamento: Saiba o que muda na vida do consumidor – YouTube

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