Dia desses recordava-me dos tempos de Aspirante-a-Oficial e dos serviços de escala de Oficial-de-dia que cumpria, ainda cheio de dúvidas e temeroso com os desafios apresentados pela vida na caserna. Esperançoso pela possibilidade de que a presente coluna alcance jovens Oficias das Forças Armadas, e alarmado pela cada vez mais farta jurisprudência do Superior Tribunal Militar que contesta a atuação de Aspirantes em lavratura de Auto de Prisão em Flagrante Delito (APFD), decidi por clarejar o assunto mencionado no título.

            É sabido que, conforme disposição do Regulamento Interno e dos Serviços Gerais (RISG), tanto em Organizações Militares de corpo de tropa como nas demais, concorrem à escala de serviço de Oficial-de-dia não só os Tenentes como também os Aspirantes-a-Oficial, em que pese estes últimos ainda sejam considerados praças especiais, conforme Art. 186, incisos I e II.

            Nesta esteira, da leitura do mesmo regulamento, ao deparar-se com o conceito definido no artigo 194 do RISG, conclui-se ser o Oficial-de-dia, fora do expediente, o representante do Comandante da Unidade. Sendo assim, por óbvio, será o Aspirante-a-Oficial a autoridade representante do Comandante quando escalado de serviço.

            Ora, imagine-se então que o Comandante-da-Guarda, ao passar em revista militar adentrando ao quartel, encontrasse em seus pertences certa quantidade de droga, incorrendo assim o dito militar em crime previsto no artigo 290 do Código Penal Militar. Em caso de ser o Oficial-de-dia um Aspirante-a-Oficial, poderia o infrator ser conduzido a sua presença para que fosse lavrado o APFD?

            A despeito do que estabelece o artigo 245 do Código de Processo Penal Militar (CPPM), que impõe ao Comandante da Unidade ou ao Oficial-de-dia a incumbência de lavratura do auto, a resposta para a pergunta acima é não, muito embora, infelizmente, com certa frequência se verifique o relaxamento de prisões em flagrante pela não observância da impossibilidade de lavratura de APFD por Aspirante-a-Oficial.

            A esta altura, o leitor menos atento deve estar se perguntando por qual razão seria nulo o APFD, eis que lavrado conforme normativa do artigo 245 do CPPM. Vamos à resposta.

            É bem verdade ser cabível ao Oficial-de-dia a lavratura de auto de prisão, tendo em vista que, ainda que segundo o artigo 7º, h, do CPPM o poder de polícia judiciária militar deva ser exercido pelo Comandante da Unidade, referido exercício pode ser delegado pelo próprio Comandante, desde que obedecidas as normas regulamentares de hierarquia, jurisdição e comando, ademais de que o próprio artigo 245 atribui ao Oficial-de-dia a incumbência pela lavratura do APFD.

            Acontece que a atribuição de polícia judiciária militar só pode ser delegada pelo Comandante da Unidade a Oficial da Ativa, o que, conquanto o Aspirante-a-Oficial concorra a serviço de escala de Oficial e, conforme Estatuto dos Militares, aprovado pela Lei nº 6.880/80, integre o círculo hierárquico dos Oficiais subalternos, não se pode olvidar que o Aspirante ainda deve ser considerado praça especial e, portanto, inapto a exercer as atribuições de polícia judiciária militar.

            Não raro o STM vem reconhecendo a nulidade de APFD lavrado por Aspirante-a-Oficial, muito embora seja passível de discussão, porquanto o próprio CPPM incumba ao Oficial-de-dia a atribuição da lavratura do auto, sem mencionar possível exceção. Entretanto, uma vez que crescente o protagonismo exercido pelo Poder Judiciário e a tendência de uniformização de teses com base no entendimento dos tribunais superiores – intenção trazida pelo novo Código de Processo Civil e que vem se consolidando também na esfera penal militar – sob pena de relaxamento da prisão em flagrante, é necessário que o agente da administração militar tenha em mente a vedação ao Aspirante para a lavratura de auto de prisão em flagrante.

            Destarte, pois que o STM, ademais, vem entendendo que somente o Oficial-de-dia e o Comandante da Unidade tem competência para lavratura de APFD, desconsiderando o conceito de autoridade correspondente ou judiciária trazido pelo artigo 245 do CPPM (tema que será objeto de uma próxima coluna), conclui-se que, em caso de Aspirante-a-Oficial estar cumprindo serviço de Oficial-de-dia e sendo necessário efetuar a prisão em flagrante por crime militar, recairá no Comandante da Unidade, sem possibilidade de delegação, a responsabilidade pela lavratura do auto.

Por: Arthur PosserTonetto

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